JUSTIFICATIVAS DE FALTAS, EXCESSO DE ATESTADOS – SUCESSIVOS OU INTERCALADOS

Inicialmente esclarecemos que não há na legislação trabalhista brasileira qualquer lei que discipline o limite de atestados médicos que podem ser apresentados pelo trabalhador para justificar sua ausência ao trabalho. Isto se deve justamente em razão do princípio da preservação da saúde, embora nos deparemos constantemente com o uso indevido da prerrogativa. Para não extremar o prejuízo às empresas, independentemente da forma como utilizado pelos trabalhadores, existe legislação previdenciária que define as situações em que os dias de ausência serão absorvidos pela empresa e aqueles que serão absorvidos pelo órgão previdenciário.

Primeiros 15 dias por conta da empresa, como será abordado, com certas peculiaridades. Por sua vez, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em seu artigo 473, elenca 12 hipóteses em que confere ao trabalhador o direito de faltar sem sofrer descontos em seu salário, englobando aquelas relacionadas às questões médicas, objeto de nosso estudo presente, destacando-se os incisos:

X- até 2 (dois) dias para acompanhar consultas médicas e exames complementares durante o período de gravidez de sua esposa ou companheira.

XI – por 1 (um) dia por ano para acompanhar filho de até 6 (seis) anos em consulta médica.

XII – até 3 (três) dias, em cada 12 (doze) meses de trabalho, em caso de realização de exames preventivos de câncer devidamente comprovada.

Somada à legislação previdenciária e à CLT, também temos as convenções coletivas de cada categoria que também podem trazer previsões relativas a justificativas e anuências de faltas, como no caso da Convenção Coletiva dos Professores, que, por exemplo, confere 2 dias de faltas por ano para acompanhar filho menor de 6 anos, enquanto a CLT prevê apenas 1 dia por ano. Já na Convenção Coletiva dos Comerciários esta benesse se estende a 15 dias e para crianças até 14 anos.

Estas variações exigem uma perfeita integração do Departamento de Pessoal com todos os instrumentos que possam disciplinar suas atividades, sob pena de incorrer em denúncias ao sindicato, bem como reclamações trabalhistas, com despesas futuras significativas e, principalmente, sujeitando-se a alegações de dano moral quando a temática envolver questões de saúde. Esclarecidos estes pontos importantes, podemos restringir essa abordagem apenas às questões relativas aos atestados médicos e já de início cabe o destaque de que, embora as convenções coletivas possam conceder benesses superiores ao previsto na CLT, isso jamais significará que a empresa deverá absorver mais do que os 15 dias previstos na legislação previdenciária para aquelas doenças classificadas pelo mesmo CID.

Entretanto, mesmo havendo essa previsão previdenciária, podemos notar que o tema ainda é pouco compreendido, pois, além de limitar a 15 dias também traz previsão de conhecimento sobre CID, sem mencionar tratar-se de contagem em dias corridos ou intercalados e até mesmo deixando no limbo as considerações sobre a não obrigatoriedade de declaração da CID. Assim, esclarecemos, a previsão da legislação previdenciária refere-se a dias corridos ou intercalados, desde que intercalados dentro de um prazo de 60 dias. Portanto, aquela tática de alguns funcionários em apresentar atestado de 14 dias a cada mês está fadada ao fracasso e os sujeitará ao encaminhamento à perícia previdenciária e efetivo desconto por faltas em seu holerite, mas não poderá ser objeto de motivação para demissão justificada ou outras sanções, vez que, como mencionado inicialmente, não existe legislação que limite a quantidade de atestados médicos. É cruel, mas real.

Mesmo com fortes indícios de má fé na obtenção e apresentação sucessiva de atestados, não havendo lei que o proíba ou limite, o máximo que a empresa poderá fazer será encaminhar à perícia se a ausência superar 15 dias em período de 60 dias e efetuar o desconto do período superior aos 15 dias. A única exceção seria a comprovação de fraude ou adulteração de atestado, o que gera demissão sumária por justa causa, sendo sempre recomendável a verificação de autenticidade quando houver suspeitas.

Outro fator a ser considerado refere-se a CID. Muitas empresas mantêm em seu regulamento interno que os atestados só serão aceitos se constar a CID, porém, essa prática viola direito personalíssimo do empregado (intimidade) e prejudica a administração de atestados e encaminhamentos à perícia do INSS, pois somente afastamentos pela mesma CID superiores a 15 dias dariam direito ao afastamento previdenciário. Ora, se não há obrigatoriedade da informação da CID, se esta divulgação viola intimidade e se o afastamento previdenciário prevê mesma CID, não havendo essa divulgação nos atestados, a empresa poderá encaminhar o funcionário à perícia mediante a apresentação de qualquer atestado ou atestados, corridos ou intercalados superiores a 15 dias.

Por outro lado, ainda que divulgada a CID, é necessário uma análise mais ampla sobre a mesma e não apenas conferir as letras e números, pois, exemplificadamente, gastrite (CID 10-K29) e úlcera (CID 10-K25) fazem parte do mesmo problema gástrico que exigiria afastamento previdenciário se houver atestado superior a 15 dias, mesmo tendo CIDs diferentes. O departamento pessoal deve estar sempre atento a estas nuances e consultar-se regularmente com seus assessores jurídicos, além de manter o hábito da consulta sobre a veracidade e idoneidade daqueles funcionários contumazes nas escusas para não trabalhar.

Devemos alertar, inclusive, que a falsificação ou adulteração de atestado é passível de denúncia e apuração de crime na esfera penal. As normativas que tratam das regras supra estão nos artigos 43 e 60 da Lei 8213/91, artigo 276 da Instrução Normativa nº 45 de 2010 editada pelo INSS, bem como nos parágrafos 4º e 5º do artigo 75 do decreto 3.048/99. Atualmente, agravou-se a prática de atestados sucessivos ou intercalados, tendo como justificativa o coronavírus, bastando que o empregado compareça em consulta médica, para que, sem nenhum critério ou ética, emita-se um atestado de 7, 10 ou 14 dias, sem, contudo, preocupar-se com os efeitos daquele atestado no funcionamento da empresa, além de não demonstrar sequer critério com a saúde do paciente, encaminhando-o à exames ou medicando-o.

Já existem casos de empregados vacinados apresentando atestado de suspeita de covid após divulgação da existência da variante indiana. É importante frisar que o que faz abonar a falta não é somente a apresentação do atestado médico, mas a configuração da inaptidão para o trabalho (Art. 6 da Lei Federal 605/49). Atestado é um documento formal emitido (supostamente) por um médico que afirma que o empregado não tem condições para o exercício da função. Uma vez confirmada a aptidão para o trabalho, o atestado não subsistiria, porém, ainda que haja previsão legal, é necessário um criterioso estudo jurídico e devida fundamentação.

Por nossa experiência, observamos que, muitas vezes, a própria empresa contribui para ser lesada por empregados desidiosos. Isso ocorre quando deixam de adotar procedimentos internos que visam a fiscalização e critérios rigorosos para coibir essas práticas, o que exige dos departamentos de pessoas e do setor de recursos humanos uma visão estratégica, capaz de mitigar essas condutas, avaliando e distinguindo empregados desidiosos dos disciplinados.

Há também aqueles que querem se desligar da empresa, seja por motivos pessoais ou simplesmente por insatisfação, mas que não querem pedir demissão e usam os atestados para justificar suas faltas, cuja finalidade é de causar estresse na empresa e, assim, alcançar seu objetivo, que é ser demitido, sendo contemplado com o pagamento dos dias que ausentou-se através de atestados e ainda recebendo integralmente suas verbas rescisórias, o que não ocorreria se pedisse demissão.

Além do prejuízo financeiro, a prática desidiosa do EMPREGADOR gerará insatisfação interna daqueles empenhados em colaborar com a empresa, causando o efeito da conhecida “maça podre” no mesmo cesto. Tenham como regra: atestados sucessivos ou intercalados de mais de 15 dias dentro de um período de 60 dias, independentemente da CID, merecem sua atenção e de seu departamento jurídico, mas não deixem também de revisar o seu regulamento interno no quesito das regras para a apresentação de atestados médicos. Duarte Rolim Assessoria e Consultoria Jurídica

Foto Lindalva Duarte Rolim

Lindalva Duarte Rolim

Sócia fundadora do Escritório Duarte Rolim Assessoria e Consultoria Jurídica, advogada especialista em instituições de ensino. Especialista em Compliance Trabalhista